E me faz de refém
Um dia vai matar você também
Amando e sofrendo por alguém
Havia três dias que ela não o via. Três longos dias. Sem telefonemas, visita-surpresa, ou mensagem de voz. Porque ele havia sumido daquela maneira?
Deitada no sofá mudando os canais da TV sem interrupção, ela só pensava em uma coisa: ele.
Até que ouviu um ‘psiu’ vindo da porta da sala. Olhou naquela direção bem a tempo de ver um envelope branco passando pelo vão da porta. “É DELE!”
Correu para abri-la, seu coração batendo forte. Estava trancada. “Cadê aquela maldita chave?! Ah não!” foi correndo até seu quarto e se deparou com sua bolsa jogada em cima da cama. Abriu-a correndo já arrancando a chave de seu interior e foi para a porta da sala, na esperança de ainda encontrar seu amado.
Tarde demais. Ele já havia partido deixando um singular envelope no chão da sala. Só notou o quanto estava tremendo quando se abaixou para pega-lo.
Dentro havia uma carta manuscrita, dizendo:
Eu te amei quando você era como uma estrela nova que surge no céu. Doce, me envolveu com seu encanto no momento em que eu nada tinha, só a vontade de ter você. Fui bobo, fácil, apaixonado, me rendi completamente aos teus desejos. Eu tudo te dei, e o mesmo tu fizestes.
Agora, porém, nada mais podemos fazer um pelo outro. Pois foi no momento em que eu percebi que eu tinha tudo, que me deu a vontade de nada ter. Pois se nada tenho, tenho pelo menos a vontade de ter você. Então permanecerei sozinho, sonhando contigo e com o tanto que és bela, quem sabe um dia eu possa novamente conquistar seu coração, então tu serás nova para mim de novo, como a novidade de outra estrela que brilha no céu.
Confusa, amarrotou a carta em suas mãos suadas, olhando para o chão. Sua cabeça imersa em pensamentos.
Deitou-se no sofá mudando os canais da TV, sem interrupção.
Carlos saiu animado da loja e dirigiu-se ao estacionamento. Apontou o alarme para seu carro e disparou. As portas foram destravadas.
Estava alegre pois tinha acabado de comprar um belo par de tênis. Sentou-se no banco do motorista e abriu a caixa que carregava debaixo do braço para avaliar sua nova aquisição.
Lá estavam eles. Sapatos maravilhosos comprados com o que havia sobrado de seu salário.
Toc Toc Toc. Um garotinho bateu no vidro. Carlos olhou pro lado e abriu a janela.
-Que é? –perguntou em tom impaciente.
-O senhor tem uma moedinha pra me dar? -Sussurrou o pobre garoto que fedia. Usava apenas um calção vermelho. Seu corpo machucado.
Carlos enfiou a mão no bolso, tirou e mostrou-a para o menino. Estava vazia.
-Não tenho – respondeu secamente.
O menino não se mexeu. Permaneceu parado ao lado do carro, encarando o homem com seus olhos grandes e brilhantes.
Apesar do incômodo, Carlos continuou a examinar orgulhosamente seu tênis e fingiu não notar o garoto, que continuava de pé, imóvel.
Cansado daquilo, lançou os sapatos no banco traseiro e gritou com o menino, despertando-o de seu sonho:
-EU JÁ DISSE QUE NÃO TENHO MOEDA! – e acelerou saindo com o carro.
Sua presença invade a casa, o coração
E sem pedir licença meu olhar se põe a brilhar
E atravessa o dia com enorme afeição
Sua companhia, o bem que me faz
E por um momento nossos olhares se encontram
E sem tormento o tempo parece parar
E nessa tarde, meus braços te chamam
Sem alarde, clamando por se entregar
Nessa história os pés se confundem
Na memória que guardei sem esquecer
Foi lembrança que em um dia certeiro
Intensamente eu me pus a viver
Seus pés tocam a grama fofa, enquanto os meus pisam em pedra polida.
O sopro frio da noite o acalenta, enquanto o ventilador modestamente me conforta.
Suas paredes são de ar, são da cor do mundo. Enquanto as minhas são de gesso branco.
Ao adormecer, a ultima imagem que seus olhos captam é da bela lua, enquanto tudo o que os meus vêem é um tolo teto.
Quem sai perdendo, afinal?
Ela morava no prédio em frente ao meu cursinho de francês.
2º andar, primeira janela da direita para esquerda.
Foi numa quinta-feira durante uma longa e entediante aula de língua francesa que eu me distraí e deixei-me levar pelo movimento dos carros e pedestres na rua lá embaixo.
Pessoas passando e carros buzinando. Fazia frio lá fora.
Até que fui despertado de meus devaneios por uma singular imagem que me fez virar o corpo em direção à janela, e esquecer de fato a aula que rolava na sala em que eu me encontrava sentado.
Havia uma garotinha de 5 anos, no máximo, na varanda do prédio em frente, trajando apenas um vestido rosa e um laço no cabelo. Movimentava seu corpo de forma aleatória e delicada, enquanto seus bracinhos serpenteavam levemente acima de sua cabeça.
À distância em que eu estava, e com o vidro da janela fechado, não era possível ouvir música alguma proveniente de seu apartamento. Logo, aos meus olhos, a menina dançava o som da cidade. Dava pequenos pulinhos e movia o pescoço, enquanto ria sozinha.
Outro aluno sentado ao meu lado percebeu o que me chamava a atenção, e observou a garotinha dançar também. Depois riu debochando da felicidade alheia – o que me enfureceu momentaneamente.
Mas mesmo com alguns pedestres que riam de seus movimentos, a garotinha parecia não se incomodar. Continuava majestosamente sua dança e ria deliciosamente, como só as crianças fazem.
Fez silêncio no mais alto grito
Abraço na mais longa distância
Brincadeiras na maior tolerância
Onde teu corpo já se fez perito
Te foi alegria em meio a tempestade
Beijo sem sentir rancor
Paixão com um toque de cor
O tom da vida, da felicidade
E foi amor o tempo inteiro
Sem duvidar de sua veracidade
Sem jogo, sem maldade
Anseio que se fez certeiro
Havia um anjo.
Não era menino, não era menina. Não tinha cabelo, vidro ou parafina.
Aquilo era apenas um anjo.
Todas as tardes, desde a criação, o anjo sentava na mesma pedra terrestre, e esperava o sol se por.
Não havia endereço, teatro ou companheiros.
Só havia uma bela imagem a seu dispor.
Certo dia, o anjo esperou, esperou de frente ao céu poente, mas nada do sol descer.
E então ele esperou, e esperou, pois tinha toda a eternidade a perder.
Até que o anjo notou depois de muito tempo passar,
Que aquilo que ele tanto esperava, não iria mais se concretizar.
Havia uma obra humana na frente, um edifício.
E enxergar o sol se por dali, era uma tarefa muito difícil.
Pobre anjinho.
Pensava a todo momento: “Quando será que os terríveis humanos irão aprender Que de nada vai importar a moeda, se o sol não aparecer?”.
E se a saudade em sua displicência
Contracenar com minha dor no peito
E em meio a tanta indolência
Deixar meu canto meio sem jeito?
E se sua falta pesar em mim
E o meu pranto, minha comoção
O dia chegar ao fim
Com seu beijo na imaginação
Não, por fim eu não vou deixar
A distância se por a apagar
Seus braços dos braços meus
E não haverá quem nos separe
Quando, em fim, tu voltares
Praquela que não te esqueceu
Encharca o rosto e lava a alma
Escorre pela face silenciosa e tortuosamente
São as lágrimas num momento sem calma
Que deslizam como o sol poente
E nessa praia o meu barco se afunda
Entre os motivos que te fazem chorar
Seu coração quebrado se inunda
Com as palavras que o fizeram afogar
E entre as ondas que vão balançando
Você questiona o seu paradeiro
Não sabe se o mar o foi levando
Ou se a correnteza o traiu primeiro