Nevava lá fora.
Ele adentrou silenciosamente a loja de instrumentos musicais, apesar do badalo dos sinos pendurados na porta. Era natal.
Talvez fosse pelo mau cheiro, ou pelas roupas rasgadas e inadequadas, aquele senhor chamou a atenção de todos os clientes da loja, inclusive a minha. Aparentou não notar os olhares que o julgavam, assim como o fato de uma das clientes ter cutucado um dos vendedores e apontar “tire já este indigente daqui”. Mas o vendedor não o fez, apenas sorriu para a mulher e pediu-lhe que esperasse um momento.
E levou apenas um momento até que o senhor mendigo alcançasse o fundo da loja, onde havia a seção de pianos. Sorriu para um modesto piano rubi, e sentou na banqueta.
Cheguei mais perto.
Tirou suas luvas surradas, deixando-as cair organizadamente próximas aos seus pés, e soprou as mãos para aquecê-las, presumo eu.
Gentilmente pressionou duas teclas brancas e esboçou um leve sorriso de prazer ao ouvir o ruído produzido. Então ele prosseguiu.
Sol, Do, Do, La.
Suas mãos encardidas sutilmente tocavam as notas da melodia mais doce de todas as já ouvidas. Dinamicamente inclinava seu corpo e movia o pescoço, enquanto os dedos arduamente bailavam pelas teclas, como se as conhecessem muito bem, produzindo o som que me fez arrepiar.
Sol, Sol, La Do Mi.
Dois vendedores se entreolharam e sorriram. Estávamos todos divinamente contagiados.
Finalizou a canção e abaixou a cabeça. Sem esperar aplausos ou vivas. Apenas apanhou suas luvas e, sem dizer uma palavra, saiu da loja, fazendo os sininhos da porta novamente badalarem ao passar.
Quem era aquele homem e por que havia feito aquilo, eu não sei.
Mas considerei este o meu presente de natal.
Amei... estava esperando por este. Ficou muito mais emocionante do que eu imaginava...Parabéns!
ResponderExcluir...e q presente!! (:
ResponderExcluirMaravilhoso Renata, pareceu-me estar vivendo aquele momento..........
ResponderExcluirDe verdade, penso, mesmo sem sentir, que ganhamos pelo menos um presente a cada dia, basta que simplesmente prestemos atenção em todas as coisas que acontecem a nossa volta, o dia inteiro. E você, moça escritora, consegue sentir isso mais que eu, mais que muita gente, acredite.
ResponderExcluirora ora que honra (:
ResponderExcluirQue sensibilidade é essa?!
ResponderExcluirFico encantada com pessoas que possuem o dom de nos desestabilizar, nos deixar sem chão!
Que maravilha, vc é capaz de perceber os "ecossistemas emocionais" que habitam os nossos dias e que por muitos motivos, não os notamos e nem os admiramos como deveríamos.
Parabéns!
poxa, muito obrigada..
ResponderExcluirQue surpresa deliciosa eu tive ao ler seu texto. Parabéns, ele é muito bom!
ResponderExcluirMilena
parnasiano.
ResponderExcluirQue lindo!!! Li por indicação de sua mãe, que conheci na Feira do Livro de Brasília .
ResponderExcluirParabéns Renata, seu blog está maravilhoso. Muita coisa boa. Um beijo. Lair Franca
Seus textos me emocionam.Parabéns!Você é portadora de uma sensibilidade incrível.Um abraço.
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