domingo, 16 de janeiro de 2011

Saudade

E se a saudade em sua displicência
Contracenar com minha dor no peito
E em meio a tanta indolência
Deixar meu canto meio sem jeito?

E se sua falta pesar em mim
E o meu pranto, minha comoção
O dia chegar ao fim
Com seu beijo na imaginação

Não, por fim eu não vou deixar
A distância se por a apagar
Seus braços dos braços meus

E não haverá quem nos separe
Quando, em fim, tu voltares
Praquela que não te esqueceu

quinta-feira, 13 de janeiro de 2011

Pianista

Nevava lá fora.
Ele adentrou silenciosamente a loja de instrumentos musicais, apesar do badalo dos sinos pendurados na porta. Era natal.
Talvez fosse pelo mau cheiro, ou pelas roupas rasgadas e inadequadas, aquele senhor chamou a atenção de todos os clientes da loja, inclusive a minha. Aparentou não notar os olhares que o julgavam, assim como o fato de uma das clientes ter cutucado um dos vendedores e apontar “tire já este indigente daqui”. Mas o vendedor não o fez, apenas sorriu para a mulher e pediu-lhe que esperasse um momento.
E levou apenas um momento até que o senhor mendigo alcançasse o fundo da loja, onde havia a seção de pianos. Sorriu para um modesto piano rubi, e sentou na banqueta.
Cheguei mais perto.
Tirou suas luvas surradas, deixando-as cair organizadamente próximas aos seus pés, e soprou as mãos para aquecê-las, presumo eu.
Gentilmente pressionou duas teclas brancas e esboçou um leve sorriso de prazer ao ouvir o ruído produzido. Então ele prosseguiu.
Sol, Do, Do, La.
Suas mãos encardidas sutilmente tocavam as notas da melodia mais doce de todas as já ouvidas. Dinamicamente inclinava seu corpo e movia o pescoço, enquanto os dedos arduamente bailavam pelas teclas, como se as conhecessem muito bem, produzindo o som que me fez arrepiar.
Sol, Sol, La Do Mi.
Dois vendedores se entreolharam e sorriram. Estávamos todos divinamente contagiados.
Finalizou a canção e abaixou a cabeça. Sem esperar aplausos ou vivas. Apenas apanhou suas luvas e, sem dizer uma palavra, saiu da loja, fazendo os sininhos da porta novamente badalarem ao passar.
Quem era aquele homem e por que havia feito aquilo, eu não sei.
Mas considerei este o meu presente de natal.

segunda-feira, 10 de janeiro de 2011

O Mar

Encharca o rosto e lava a alma
Escorre pela face silenciosa e tortuosamente
São as lágrimas num momento sem calma
Que deslizam como o sol poente

E nessa praia o meu barco se afunda
Entre os motivos que te fazem chorar
Seu coração quebrado se inunda
Com as palavras que o fizeram afogar

E entre as ondas que vão balançando
Você questiona o seu paradeiro
Não sabe se o mar o foi levando
Ou se a correnteza o traiu primeiro