domingo, 27 de fevereiro de 2011

Little Dancer

Ela morava no prédio em frente ao meu cursinho de francês.
2º andar, primeira janela da direita para esquerda.

Foi numa quinta-feira durante uma longa e entediante aula de língua francesa que eu me distraí e deixei-me levar pelo movimento dos carros e pedestres na rua lá embaixo.
Pessoas passando e carros buzinando. Fazia frio lá fora.
Até que fui despertado de meus devaneios por uma singular imagem que me fez virar o corpo em direção à janela, e esquecer de fato a aula que rolava na sala em que eu me encontrava sentado.
Havia uma garotinha de 5 anos, no máximo, na varanda do prédio em frente, trajando apenas um vestido rosa e um laço no cabelo. Movimentava seu corpo de forma aleatória e delicada, enquanto seus bracinhos serpenteavam levemente acima de sua cabeça.
À distância em que eu estava, e com o vidro da janela fechado, não era possível ouvir música alguma proveniente de seu apartamento. Logo, aos meus olhos, a menina dançava o som da cidade. Dava pequenos pulinhos e movia o pescoço, enquanto ria sozinha.
Outro aluno sentado ao meu lado percebeu o que me chamava a atenção, e observou a garotinha dançar também. Depois riu debochando da felicidade alheia – o que me enfureceu momentaneamente.
Mas mesmo com alguns pedestres que riam de seus movimentos, a garotinha parecia não se incomodar. Continuava majestosamente sua dança e ria deliciosamente, como só as crianças fazem.

Na terça-feira seguinte, sentei-me no mesmo lugar na classe e esperei com crescente expectativa a dança da pequena garota, para me divertir e fazer-me sentir infantil e despreocupado de novo, mas ela não apareceu. Nem na quinta-feira seguinte, nem na outra terça.
Ela não voltaria mais. Eu não mais veria seus passinhos. Então guardei na memória aquele doce momento que
vos contei aqui.

3 comentários:

  1. É que a vida, minha filha, passa por nós como um trem com muitos vagões, onde vislumbramos cenas únicas, de um ato ou lembrança. E mesmo que não as contemplemos mais, ficam em nossa memória como uma doce passagem, um espetáculo também único, muitas vezes compreendido apenas por nós mesmos, como se não conseguíssemos compatilhar esses "momentos únicos" com mais ninguém.
    ADOREI o jeito com o qual vc detalhou a cena!!

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  2. ...vida que passa como vagões de um trem com vários vagões que vão acumulando encontros e desencontros, amores e desabores, alegrias e tristezas, vitórias e derrotas mas que se não passarem pela estação das nossas vidas é sinal de que já não temos vida, não é?
    Mais uma vez vc veio encantar o meu coração com mais esse texto(?)Parabéns!

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