terça-feira, 7 de setembro de 2010

Ambulância

Segurava firmemente sua mão enquanto olhava fixamente em seus olhos, desejando que essa não fosse a ultima vez que os veria abertos, olhando de volta. Respirava junto a ela, compassadamente, movendo levemente o peito.
Sua face exibia um semblante triste, porém confortante.
Não me segurei, cheguei mais perto para saber o que ali estava acontecendo.

Vi-la aproximar-se ainda mais e soprar o rosto da mulher estirada no chão, como se o sopro fosse aliviar seu pesar. A mulher tentou sorrir em agradecimento, mas tudo o que conseguiu fazer foi entortar penosamente seus lábios, fazendo uma careta quase que monstruosa. Ela sentia dor.
Ainda segurando sua mão, com os olhos brilhando, a menina sussurrou “Você é tudo para mim, mãe”.
Novamente, a mãe não conseguiu responder verbalmente, apenas retribuiu o olhar da filha, carregado de sentimento, com certo ar de ‘adeus’.

Examinando seu corpo deitado percebi que uma pequena (porém considerável) massa de sangue jorrava de um ponto de sua barriga, o qual ela tentava com grande esforço apalpar, mas a dor parecia maior.
Deve ter uma bala ali- eu pensei. – Como será que ela foi acertada? – Mas meus pensamentos foram interrompidos por um gesto da filha, que inclinou novamente seu corpo sobre o da mãe, dessa vez para beijar-lhe a testa.

-Mãe, o nome daquela musica que você me perguntou outro dia é “a heart to hold you”, desculpa por não ter me lembrado na hora.
Tudo que a mãe conseguiu pedir foi “cante”. E então, puxando mais um porção de ar, a filha cantou um breve trecho de uma triste canção, desafinada pela dor.
Sorrindo, a mulher fechou os olhos e deixou a cabeça pender para a esquerda.
Ela se foi.
Nesse momento a filha desafinou ainda mais a canção, que deu lugar a um choro abatido e introspectivo.

A ambulância chega. Entram mãe e filha.
Vejo a ambulância se distanciar.

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