Sentiu suas mãos formigando. Coçando. Sabia que o sangue que corria ali borbulhava, atrapalhava.
Mesmo assim, não era incômodo bastante para fazer-lhe abrir os olhos.
“continuarei aqui, deitado” ele suplicava. Mas as pernas já moviam. E a sensação extasiante de tédio e medo apoderou-se dele.
Estava se movimentando, ele sabia. Estava sentado agora.
Só não forte o bastante para abrir os olhos. Não, ainda não.
E esse cheiro? Inexplicável. Nada que tenha sentido antes. Onde estava afinal?
Ele não sabia.
Certo, abra os olhos agora.
Eu disse para abrir os olhos!
Rapidamente, levou as mãos ao rosto, apalpando freneticamente a pele suja. Seus dedos ásperos sentiram os olhos bem abertos. E o desespero, então, chegou.
Cego: Ele não podia pronunciar essa palavra. Sim, estava cego. Não haviam apagado a luz. Ele sabia que não.
Estava em pé agora. Aliviado, pelo menos as pernas ainda trabalhavam. Começou a correr até tropeçar em um tronco, e outro. E se deu conta que o que havia amparado sua cabeça durante a queda foi um monte fofo de folhas caídas. Cheiro de outono, agora pôde identificar.
Uma floresta, sim, era o que parecia! H. não podia enxergar, mas não foi difícil notar que estava cercado por árvores. Estava se acostumando com a idéia de estar ali, o medo foi suprido por uma alegria pequenininha que ia surgindo dentro dele. Até que ouviu alguém rindo mais alto.
Virou-se rapidamente, cauteloso para não cair de novo, mas topou com escuridão. O ar agora exalava presença humana. H. só não sabia quem era.
Ouviu passos. Toc toc. Um, dois. Ainda sentia o cheiro humano, mais para a esquerda agora. (O que lhe parecia o oeste). Vagarosamente, foi seguindo o cheiro e a presença, a cada passo ele gostava mais desse jogo. Até esboçava um sorriso tímido. Guiado pelo instinto, andou durante horas (é difícil ter noção de tempo quando não se pode enxergar a trajetória da luz do sol) até que colidiu com um muro de pedra.
Percebeu então estar acompanhado por muitas pessoas agora. Aquele muro de pedra cercava, com certeza, uma civilização. Foi andando e tateando, seguindo o burburinho cada vez mais alto, até podia distinguir vozes agora.
Latim, dezenas de pessoas falando latim. E de repente, H. sentiu aquela primeira presença que o guiou desde a floresta, uma bela voz sussurrou “bem-vindo ao seu reino, Horacio”.
Caindo da cama, o professor de história despertou.